Sobre as perturbações espirituais

Francisco Muniz


No livro Evangelho de Tomé, texto ainda considerado apócrifo, quer dizer, sem reconhecimento de sua autoria ou autenticidade, há uma frase atribuída ao Cristo que merece profunda reflexão por parte dos aprendizes do Espiritismo, doutrina que se pauta inalienavelmente nos ensinamentos de Jesus. A frase é esta: “Aquele que busca continue procurando até quando encontrar; encontrando, ficará perturbado; perturbado, ficará maravilhado; e, maravilhado, reinará sobre o todo”. Podemos interpretá-la de várias maneiras, a partir do simbolismo impresso em cada uma dessas palavras, mas a interpretação feita sob as luzes da Doutrina Espírita vem bem a calhar, conforme o aprendizado com as obras da Codificação. Assim, entendemos que todos nós somos aprendizes e buscamos o conhecimento da Verdade, que não se revela integralmente aos buscadores senão aos poucos, de acordo com os esforços de cada um por merecer tal benefício, de modo que sempre haverá a necessidade de se buscar cada vez mais até que sejamos de fato plenificados de sabedoria.

Enquanto isso não acontecer, haveremos de considerar nosso quase permanente estado de perturbação, que se intensifica exatamente quando não nos dispomos sinceramente à busca do sentido da vida, manifestando a consciência de sono. Uma vez semidespertos, qual nos encontramos presentemente, e recorremos ao auxílio das orientações que apontam para a Verdade proclamada pelo Cristo, como assim procede o Espiritismo, reconhecemos de pronto essa perturbação ao compreendermos a realidade da reencarnação e voltarmos o pensamento para o passado, que não raras vezes nos foi desabonador. Encontramos, dessa maneira, a verdade da causa de nosso sofrimento, representado pelas dificuldades enfrentadas nos campos emocional e relacional (familiar e social), razão das provas e da expiação que o Espírito encarnado é chamado a realizar, com vistas à sua depuração.

É então que a terceira parte do ensino de Jesus a Tomé merece atenção, ao percebermos que, por termos infringido as leis de Deus, nós mesmos causamos a situação dolorosa em que nos encontramos e que só depende de nosso esforço em prol da renovação moral a modificação de nosso estado íntimo, através do autoconhecimento. E isso, convenhamos, nos deixa maravilhados, considerando principalmente a finalidade desses esforços: reinarmos sobre “o todo”. E aqui os Espíritos Superiores mensageiros da Codificação vêm nos esclarecer, ao informar que o homem é um ser trino – ao mesmo tempo espírito, perispírito e corpo – detentor de duas naturezas, a espiritual, permanente, representada pela alma imortal, e a material, ou humana, transitória, representada pelo corpo físico.

É tarefa de cada um promover esse reconhecimento, a fim de poder tomar as providências necessárias à correção de rumo e realizar-se como aquele homem de bem descrito por Allan Kardec nas páginas de O Evangelho Segundo o Espiritismo, em seu Cap. XVII (“Sede perfeitos”). Somente assim o homem, conhecendo a Verdade em si e em torno de si, aprenderá a se libertar dos atavismos destruidores que ainda o fazem escravo dos vícios, manifestando atitudes contrárias à sua saúde psíquica, que não poucas vezes resultam em comprometimento da saúde física e mental, produzindo quadros obsessivos como os que o Espírito Manoel Philomeno de Miranda descreve em seu livro Reencontro com a Vida (psicografia de Divaldo Franco).

Segundo esse autor espiritual, a falência da fé religiosa, a sede insaciável dos gozos materiais, a cultura voltada para o corpo constituem engodos criados para distrair as mentes e dominá-las, provocando o surgimento de uma grande legião de depressivos. “É muito fácil, no entanto, reverter o quadro”, diz-nos o digno repórter do Mundo Espiritual, “mediante a mudança cultural e moral dos indivíduos, voltando-se para os valores do Espírito e da sua imortalidade, sem qualquer prejuízo para a vida física, antes concedendo-lhe qualidade, meta e meios para torná-la feliz”.

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