Das humanidades

Quando era eu um reles barnabé e prestava serviço à Universidade Federal da Bahia, ouvi de um professor da área médica que o Homem é uma verdadeira praga no corpo do planeta, por ser capaz de acumular arsenais bélicos com o poder de destruir a Terra três vezes! Então militante nas hostes da Doutrina Espírita, presunçosamente eu acreditava que sabia um pouco mais que o amigo acadêmico, apenas porque admitia a imortalidade da alma e ele, hoje na Pátria da Verdade, talvez fosse materialista, e assim considerei: "Se o Homem é o problema, ele também é a solução".
Sigo pensando do mesmo jeito, que ainda não encontrei, em meio ao negativismo reinante, motivos verdadeiramente fortes que me façam mudar de ideia. Sim, enquanto espécie, o Homem é tanto o bem quanto o mal no seio de Gaia e essa condição fica muito bem retratada nos poemas realistas de João Fernando Gouveia neste livro inspirado e inspirador. Nesses poemas, a humanidade é implacavelmente reduzida a suas duas feições naturais: forma e essência, das quais o leitor logo se aperceberá principalmente porque o autor se vale, magistralmente, do pensamento condutor de Augusto dos Anjos, cujo estro encharcado da seiva da vida angustiada ante a morte inevitável questiona a humana fragilidade.
João, desse modo, nos dá uma aula de filosofia, transitando do ponderável ao transcendental, das questiúnculas próprias do ser humano que só enxerga o mundo a partir de sua pequenez às graves argumentações da astronáutica e da biologia, da física e da economia. "Alguém possui uma resposta plausível?" - indaga ele, por sua vez, recordando a eterna dúvida sobre quem somos nós: "Baratas tontas?" - arrisca.
Mas ao mesmo tempo que interroga João Gouveia oferece possibilidades de solução do grande mistério que é o Homem, revelando pistas de sua milenar viagem pelo tempo em busca da razão de si mesmo. Enquanto isso, ele - o Homem - desenvolve sua história, cria o progresso, cresce perante a Natureza que o cerca e, queira ou não, ajoelha-se perante a poderosa força criadora que é seu Criador.
Gigante do pensamento, o Homem vai às distantes galáxias e apequena-se ante a dor que o aniquila; herói das sagas da formação dos povos, sofre ante os impositivos da morte. Que é o homem, por que nos dizemos humanos, que vem a ser nossa humanidade se o mais das vezes, belicosos como (ainda) nos vemos, comprazemo-nos derramando o sangue de um semelhante, desconhecendo ser esse sangue a mesma seiva que nos corre nas veias?
Mas um dia virá o despertamento - pela poesia? pela ciência? pela religião?
Um dia o Homem se descobrirá, revelando seu mais torturante enigma. Nesse dia, praza aos Céus, ele se lembrará de que o chão do planeta, ainda tão adusto, já foi pisado inúmeras vezes por antigos profetas, filósofos, luminares do saber, da arte e da ciência que deixaram aqui traços da imortal sabedoria, esperando que nós, seus herdeiros, refaçamos o caminho da ancestralidade e assim defrontemos nossa verdadeira face. 

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